1953: vaca “Cherry” e seu dono argelino; Augusto tinha piu-piu; e FRG era SJP‏

Grande Curitiba, 1953

Grande Curitiba, 1953: a área urbana era só a mancha escura na Zona Central.

Por Maurílio Mendes, “O Mensageiro”

Publicado em 11 de janeiro de 2013

Maioria das fotos de minha autoria. As que forem baixadas da internet identifico com um ‘(r)’, de ‘rede’, créditos mantidos sempre que impressos nas mesmas.

Vejam um mapa do município de Curitiba e imediações de 1953.

A imagem foi modificada por mim pra ressaltar algumas coisas que mudaram:

Todos sabem que o nome Bacacheri (Zona Norte) vem de um animal, a vaca Cherry.

Da época que ali haviam chácaras. O dono de um pequeno sítio tinha um desses bichos, chamada “Cherry” (‘Querida’, em francês).

Vaca 'Cherry'

Uma vaca, só que essa não é a ‘Cherry’ (r).

Como é notório, os espanhóis pronunciam a letra “v” como se fosse “b”.

Escrever ‘Curitiba’ ou ‘Curitiva’ pra um hispano-falante dá no mesmo, se fala igualmente Curitiba.

Logo, um espanhol (ou português oriundo de região fronteiriça com a Espanha) chamava o animal de “baca Cherry”, que foi simplificado pra “Bacacheri”.

Argelia1Essa história é relativamente famosa. Menos conhecido é o fato que parte do Bacacheri já se chamou “Colônia Argelina”, e nesse mapa consta essa denominação.

Isso porque, na primeira metade do século 20, o Bacacheri foi povoado por algumas famílias de franceses.

Boa parte deles havia vivido antes na Argélia, então colônia da França.

ArgeliaDe forma que a região, na época área rural, cinturão verde fora da cidade, foi batizada homenageando os colonos franceses recém-egressos desse território africano (cujo mapa e bandeira vemos nessas imagens).

Numa atualização de abril de 2024, vamos adicionar mais algumas fotos sobre o bairro.

Aqui e a seguir: marcos de cimento na Av. E. Gaertner mostram a distância pro Centro (‘Curityba’) e – no verso – pro Atuba e 4 Barras, remanescente do tempo que a via era parte da Estrada da Graciosa (ambas as tomadas registradas em 2024).

A ‘espinha dorsal’ do Bacacheri é , o sabem, a Erasto Gartner.

Hoje, e a muito tempo, ela é uma avenida totalmente urbana, completamente inserida dentro da cidade.

Nem sempre foi assim, entretanto. Na época da ‘Colônia Argelina’ essa via era uma rodovia.

Sendo mais específico: era o começo, ainda dentro de Curitiba, da Estrada da Graciosa – então a única ligação da capital com o Litoral do estado.

A prova são esses antigo tótens de concreto, instalados (prov.) no século 19, mas que ainda estão lá em pleno século 21.

Na frente (no sentido Centro/bairro) ele indica que já estamos a 6 quilômetros de ‘Curityba‘.

Querendo com isso se referir ao Centro da cidade, então bem menor obviamente.

Não é erro de digitação. Até o meio do século 20 eram comuns as grafias ‘Curityba’, com ‘u’ e ‘y’, e ‘Coritiba’, com ‘o’ e ‘i’.

Essa última foi preservada pelo time de futebol (não sou coxa-branca, cito esse clube apenas pra falarmos de como a cidade já foi chamada).

Voltando a falar da sinalização preservada da antiga estrada, no verso informa que estamos a 4 km do Atuba e 17 de Quatro Barras.

Em imagem de 2021, pôr-do-sol no Parque Bacacheri (criado em 1988 onde antes era um banhado); os prédios ficam na Boa Vista.

Ao fundo o Torino ‘6’ da Glória, numerado BI012, no  Alimentador 342-Bairro Alto/Boa Vista.

Linha que une terminais das Zonas Leste e Norte, respectivamente (o Bacacheri fica entre esses dois bairros).

………….

Vejam que em 1953 três municípios que fazem limite com Curitiba eram bem maiores:

Agora inverteu: estou na B. Vista, os edifícios altos ao fundo no Bacacheri – foto de 2014.

Por exemplo, na ocasião São José dos Pinhais (SJP) incluía em seu território os atuais municípios de Mandirituba e Fazenda Rio Grande (FRG).

Dia desses, comentei que Fazenda Rio Grande (Zona Sulmetropolitana) havia pertencido ao município de São José dos Pinhais. De fato assim se deu.

Um colega que não conhecia esse pormenor comentou que Fazenda Rio Grande se separou de Mandirituba, em 1992, e é verdade.

A questão é que a própria Mandirituba já havia se separado de São José, em 1960.

Praça Rui Barbosa, no Centro, anos 50 (r).

Como esse mapa é dos anos 50, aqui São José dos Pinhais vai até Araucária.

Eu mesmo marquei o limite que foi instituído em 1960, entre São José e Mandirituba (1960-1992).

E, depois que Fazenda se tornou independente de Mandirituba, entre São José dos Pinhais e Fazenda Rio Grande (1992-presente).

Correção: anteriormente eu escrevi que esse era um “ônibus da Auto Viação São José na década de 50”. Um colega me retificou: “O ônibus da foto não pertenceu à Auto Viação São José Ltda de São José dos Pinhais-PR. Esta empresa nos anos 50/60 era denominada Auto Viação Santo Antonio – (de) São Jose dos Pinhais. Pertencia a família Zen, tradicional por aqui. Nesta época a empresa utilizava basicamente modelos da fabricante paulista CAIO com motorização Mercedes-Benz.” O amigo tem razão. O buso dessa foto foi da Auto Viação São José de Urussanga-Stª. Catarina (r). Creio que esteja aposentado, mas … quem sabe? Pergunto pois na mesma Urussanga há (em 2016) na ativa 2 bichões fabricados em 1976, com 40 anos de pista –  e contando!!!

Também em 1992, o distrito de Pinhais se tornou município, se separando de Piraquara (esses dois ficam na Zona Leste da Grande Curitiba). Observa os nomes no mapa.

Enquanto que Timoneira é o atual Almirante Tamandaré, na Zona Norte metropolitana.

Além da mudança de nome, houve aqui mais um seccionamento.

Da linha vermelha pra esquerda, hoje ali é Campo Magro, que se separou de Almirante Tamandaré em 1996.

………

Algumas outras curiosidades:

– O atual Capão Raso (Zona Sul) aqui é nomeado “Capão Grande”.

O bairro que hoje se chama Sítio Cercado (também Zona Sul) está grafado Boa Vista.

Só veio a ser conhecido por Sítio Cercado depois, quando o dono do que era uma grande chácara começou a dividir e vender sua propriedade como lotes urbanos.

1914

Mapa de 1914 em que o nome ‘Argelina‘ também está presente. Veja essa outra matéria com diversos mapas antigos, do meio do século 19 ao meio do século 20.

Justamente tem esse nome por ser cercado por pequenos rios.

Ainda na Zona Sul, vejam que há 2 “Xaxim”. Um é o atual Xaxim mesmo, e ficou como estava.

Acima dele, onde hoje estão partes da Vila Fanny, Vila Hauer e mesmo o norte do Xaxim, tudo isso era chamado então de “Xaxim Cercado”.

Nessa matéria eu falo mais de antigos bairros e municípios da Grande Curitiba.

onibus Sao Jose dos Pinhais anos 80[1]

Agora sim um ônibus da Auto Viação São José dos Pinhais (r). Embora num período mais recente: esse Monoboloco deve ser dos anos 70, e circulou nessa configuração até os anos 80. Veja outro Monobloco, bem mais novo, mesma viação e pintura, em foto colorida dos anos 90.

Já demos conta da “Baca Cherry” e da “Colônia Argelina”, e também de FRG e SJP. O que significa então aquele “Augusto tinha piu-piudo título?

Pra falar disso, vamos agora pra Zona Oeste. Ali há um bairro que se chama atualmente Augusta, um nome de mulher obviamente.

Entretanto, no mapa diz Colônia Augusto, homenageando um homem.

Ops, alguma coisa estranha deve ter acontecido aqui….

De fato aconteceu. O governador Lamenha Lins formou diversas colônias agrícolas na Zona Oeste.

Homem virou mulher

Na ficção homem se torna mulher a revelia (r).

Que então era área rural. Pra acolher a leva de imigrantes que chegavam da Europa (especialmente italianos e poloneses).

Ele criou a Colônia Dom Pedro, na divisa entre os municípios de Curitiba e Campo Largo, e, um pouco abaixo Lamenha Lins homenageou o primeiro neto de Dom Pedro.

parque passaúna ctba augusta z/o lagoa reflexo anoitecer divisa campo largo

O mesmo aconteceu com um bairro de Curitiba: a Colônia Agusto virou o bairro Augusta. Ali fica o Parque Passaúna, onde registrei esse belo anoitecer em 2016.

Um neto homem, varão, chamado Dom Augusto. Aí surgiu a Colônia Augusto, e em 1953, como constatam, ela ainda tinha seu nome original.

A imagem não está bem nítida, mas se você prestar bem atenção dá pra ver.

Entretanto, algum tempo depois, sabe-se lá porque, resolveram transformar Dom Augusto em Augusta, feminizando seu nome.

E por isso uma cena do filme “Pele que Habito”, de Almodóvar, a direita. Pra quem não viu, é a macabra história de um homem que foi sequestrado.

1959_hospital_evangelico

1959: início da construção do Hospital Evangélico, no Bigorrilho, Zona Oeste (r). Já que tocamos nesse tema, a seguir com um desenho da enfermeira cuidando do paciente.

E contra sua vontade, transformado em mulher. De forma completa, cirurgicamente.

Com Dom Augusto o mesmo se deu, só que depois de morto.

‘Cortaram o piu-piu’ do neto de Dom Pedro. Que coisa, né?

Entretanto esse mapa prova que o nome original do bairro era masculino.

Já produzi reportagem completa específica sobre a Augusta.

A CURADORA: com suas “mãos de luz” (publicado em 24 de março de 2016).

Mostrando o parque, a parte rural, as favelas e as vilas urbanas, antigas e novas.

Também na Zona Oeste há um outro caso igual, de uma pessoa que virou nome de bairro após ‘passar pelo arco-íris’.

Acontece que aí na mão inversa, masculinizaram uma mulher.

Surgiu o bairro do Bigorrilho, ex-Bigorrilha. Coloquei no ar essa postagem também.

………..

A numeração  é31A09, portanto da época que as linhas metropolitanas eram gerenciadas pela prefeitura de Curitiba, de 1996 a 2015 (r).

Ao lado Fazenda Rio Grande. Posto que falamos um pouco desse município na Zona Sul, um Busscar, na segunda e mais duradoura padronização dos ônibus municipais, amarelo embaixo e branco em cima.

Hoje os busos fazendenses usam a padronização metropolitana da Comec, unicolor bege.

FAZENDA DAS FLORES” – publicado em 22 de janeiro de 2015. Encerro com essas belas imagens da Faz. R. Grande:

Deus proverá”

4 comentários sobre “1953: vaca “Cherry” e seu dono argelino; Augusto tinha piu-piu; e FRG era SJP‏

  1. Anônimo disse:

    Essa lenda da Vaca Cherry, e do Bacacheri não tem nenhum fundamento histórico. Vejam que o Rio Bacacheri já tinha esse nome antes da colônia Argenila estar ali. “Um espanhol que chamava o animal”??? quem é o sujeito? não tem nada documentado sobre isso. Infelizmente, inverídico.

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    • omensageiro77 disse:

      Amigo, eu aceito qualquer retificação, e já corrigi inúmeras matérias. Desde que a retificação aponte fatos, e não opiniões. Nessa mesma postagem há o exemplo. Um leitor me mostrou que eu havia identificado errado aquele ônibus antigo que aparece em frente a um paiol. Prontamente corrigi.

      Publiquei seu comentário, porque deixo que cada um julgue por si só. Entretanto, coloco que achei seu julgamento um tanto autoritário. Não creio que você conheça tanto assim os pormenores da história do bairro pra dar um veredito tão definitivo, que me parece ser baseado somente em sua opinião.

      Todos são livres pra pensar como quiser, eu respeito sua opinião, por isso a publico aqui. Agora, dizer “inverídico” é fácil, qualquer um faz. Comprove o que diz.

      Eu te pergunto, já que você parece conhecer tão definitivamente a história do Bacacheri: qual a origem do nome, então?

      Vamos fazer o seguinte: se essa versão é ‘lenda’ como você afirma tão definitivamente, apresente outra versão pra origem do nome do bairro.

      Se você fizer isso e ainda apresentar os documentos históricos que comprovam o que afirma eu mudo a postagem.

      Se mesmo sem conseguir comprovar ao menos você apresentar uma hipótese coerente, sem excluir a versão da ‘Vaca Cherry’ eu ainda assim adiciono sua versão no texto e digo que há duas possibilidades.

      Agora, negar por negar dizendo que não há provas mas sem apresentar provas em contrário e esperar que os outros acatem apenas porque é você quem está dizendo, isso me parece o ‘la garantía soy yo’ que existia num comercial dos anos 80.

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  2. João Bueno de Sá disse:

    O ônibus da foto não pertenceu à Auto Viação São José Ltda de São José dos Pinhais-PR. Esta empresa nos anos 50/60 era denominada Auto Viação Santo Antonio – (de)
    São Jose dos Pinhais. Pertencia a família Zen, muito tradicional por aqui. Nesta época a empresa utilizava basicamente modelos da fabricante paulista CAIO com motorização Mercedes-Benz.

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