Por Maurílio Mendes, “O Mensageiro”
Publicado em 23 de maio de 2014
Como todos os ‘curitibocas’ sabem, “Xaxim Social” é um trocadilho que une o nome de dois bairros da cidade, o Jardim Social na Zona Leste e o Xaxim na Zona Sul.
Era sátiro e contrastante, mas com as mudanças de rumos da urbe não é mais tão contrastante, nem tão sátiro.
Explico. O Jardim Social é um bairro de classe alta, tem a segunda maior renda da cidade atrás apenas do Batel na Zona Central.
Já o Xaxim até o começo dos anos 90 era um bairro bem de periferia, majoritariamente de classe baixa e média-baixa.
Não mais.
Acontece que o Xaxim, embora totalmente dentro da cidade, ainda tinha extensos terrenos vagos em seu interior.
Por isso ali surgiram enormes condomínios de sobrados geminados de classe média e mesmo média-alta.
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A mesma situação se repete ‘ipsis-literis’ no Uberaba, Zona Leste, e Campo Comprido, Zona Oeste.
Hoje nos 3 há vários sobrados triplex que facilmente superam o meio milhão de reais.
Ou seja, grandes nacos do Xaxim e dos outros 2 bairros (que até duas décadas atrás tinham um perfil mais humilde) agora de fato lembram um pouco o Jardim Social. Boa parte da ironia se foi.
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Porém nem toda. Em todos eles algumas partes ainda são periferia, ainda tem perfil de classe trabalhadora.
Do Campo Comprido e Uberaba nos ocupamos com detalhes em outras oportunidades. Nosso tema de hoje é o Xaxim.
Vamos dar uma volta no Jardim Maringá (o nome é uma homenagem a 3a, maior cidade do Paraná, no Norte do estado).
Porém aqui nos referimos a Zona Sul de Curitiba. Ali, o Xaxim não mudou.
Digo, mudou, se adensou, a laje subiu. Mas a classe social que o habita ainda é a mesma.
Ainda é um bairro de periferia. As vezes convivendo lado a lado com porções bem mais ricas.
O Xaxim tem outras partes que ainda não se aburguesaram de todo.
Além do J.M. recém-citado, que é no planalto e na ladeira, poderíamos destacar pedaços da Vila São Pedro.
Me refiro as Vilas Rex e Mariana e o Jardim Europa, na baixada do Ribeirão dos Padilhas.
E também a Vila Urano, na baixada que fica na outra margem do mesmo rio.
Hoje, nos focaremos especificamente na parte alta e inclinada. Os vales do riacho ficam pra outro dia.
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Vamos falar em termos práticos. Você está num bairro que tem muitos sobrados.
Como definir se é uma região operária ou de burguesia (ainda que baixa-burguesia)?
Óbvio que quem conhece a periferia sabe de cor a diferença, basta olhar pra saber:
Sempre que as casas forem iguais trata-se de um conjunto entregue pronto, de padrão e renda mais altas.
Quando, ao contrário, cada residência tiver um estilo, trata-se de regiões ainda de periferia, de classe trabalhadora.
Que se melhoraram significativamente após o plano Real, mas ainda se trata de subúrbio.
E não de classe média. Mesmo que sejam majoritariamente sobrados.
Há um contraste agudo entre as partes que se aburguesaram e as que não.
Ambas têm muitos sobrados, mas as semelhanças param aí.
É simples entender a diferença. Os conjuntos comprados prontos são bem caros.
Resultando que sabemos que uma família de classe média se mudou pra ali recentemente.
Vinda de bairros mais centrais, e financiou no banco o pagamento em décadas.
Os sobrados artesanais têm origem muito, mas muito distinta.
São famílias proletárias que moram no Xaxim geralmente há várias décadas.
Desde o tempo que ali era um subúrbio afastado, portanto o terreno não era um valor exorbitante.
Até pouco tempo atrás residiam em casas humildes, boa parte delas de madeira.
Lotes sem muro, quintais enormes, enfim, a periferia típica do Sul do Brasil que já falamos tantas vezes.
Acontece que, como igualmente já falamos repetidamente, Curitiba está (metaforicamente falando) num processo de deixar o Sul e se integrar ao Sudeste.
Ao menos no que se refere a arquitetura de seus subúrbios, repetindo um processo que o próprio Sudeste passou no ciclo anterior.
Ou melhor dizendo, a capital do Paraná agora é uma transição entre Sul e Sudeste, tendo características de ambas as regiões.
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Falando nisso, veja como as casas de madeira se distribuem pelo continente.
Ainda tem centenas de milhares de casas de madeira, eu mesmo moro numa delas.
A questão é que partes de sua periferia se adensaram e se verticalizaram muito.
Vemos ao longo da página algumas tomadas do J. M., que ainda é uma periferia densamente habitada.
Me referi acima, e também em outras matérias (sobre o CIC na Zona Oeste por ex.) a “Cidade da Laje”.
Por isso quero dizer vilas na periferia em que predominam os sobrados “artesanais”:
Todos sabem como eles surgem, enfatizando de novo.
Primeiro o cara construiu uma casa térrea, porque era o que o orçamento podia bancar.
Depois de um tempo ele “enche a laje” e faz mais um andar.
Na maioria das vezes sem que um engenheiro assine a obra e sem alvará, é assim que as coisas funcionam.
Pode parar por aí, e a casa ficar com dois andares, ou o processo pode continuar.
No fim, alguns bairros ficam cheios de triplex, e mesmo de prédios artesanais, de 4, 5 e mesmo 6 andares, sempre enchendo lajes.
Aqui em Curitiba há vários bairros que concentram alguns triplex sem alvarás, mas de 4 ou mais andares é mais raro.
No entanto, na periferia de São Paulo, Rio, Belo Horizonte-MG, Vitória-ES e Salvador-BA, igualmente em Buenos Aires-Argentina, esse é o padrão.
Então. Aqui ele não predominam ainda em toda periferia.
Apenas em bairros determinados como o Bairro Novo A (Sítio Cercado) e partes grandes do CIC, Tatuquara, Uberaba e Cajuru.
No Xaxim os sobrados artesanais são ínfima minoria, como o são no vizinho Boqueirão (veja a origem desses nomes).
Nesses dois bairros da Zona Sul, a “Cidade da Laje” não é regra mas exceção.
Na rua que eu morei por 15 anos no Boqueirão são comuns.
A razão é porque se trata de uma invasão, o Canal Belém.
Fora da margem do rio eles são raros no Boqueirão, como já expliquei e demonstrei.
No Xaxim o mesmo se dá. Os sobrados artesanais se restringem a poucas vilas.
Sendo o Jardim Maringá a maior delas, seguido pelas vilas São Pedro e as que se aglutinaram as margens do Ribeirão dos Padilhas.
Tudo somado: o Xaxim era periferia. Daí o trocadilho “Xaxim Social“.
Irônico ao extremo, pois o bairro não se parecia em nada com o Jardim Social.
Só que a coisa mudou muito, surgiram sobrados triplex geminados de alto padrão.
E partes do Xaxim hoje só a classe média alta pra cima pode habitar.
Veja abaixo mais um condomínio fechado, símbolo de mudança de perfil da região.
Evidente que ainda está longe do padrão do Jardim Social original.
Ainda assim a diferença é bem menor que um dia foi, não é mais diametralmente oposta.
O Xaxim hoje, boa parte dele, é pra quem pode pagar. Quem diria, hein?
Só que nem todo. Uma parte do Xaxim ainda é subúrbio, ainda é do popular. Assim é o Jardim Maringá.
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Comentemos as fotos. Muitas não estão ao lado da descrição, identifique pela legenda.
– Começando por essa ao lado, grande de sequência de imagens que foram feitas na Rua David Towns.
(Quando falo em ‘década passada’, me refiro a 1ª década do milênio.)
A via corta o Xaxim e termina no Bairro Novo, Sítio Cercado;
– Claro que não poderíamos esquecer do busão. Chovia muito, como notam.
Isso não me incomoda nem um pouco, não foi a primeira vez que saio fotografar embaixo de chuva.
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Apesar do nome, o ponto final do Maringá não é mais no Jardim Maringá.
E sim na Vila São Pedro, ambos são vilas do mesmo bairro que é o Xaxim.
O ônibus passa pelo planalto que é o Maringá, mas termina sua trajetória na parte baixa do bairro.
As margens do Ribeirão dos Padilhas que separa o Xaxim do Pinheirinho e Sítio Cercado.
Além disso, vemos no decorrer da matéria:
– Pichação apresenta pra quem não conhece: “Curitiba – J. M. – Zona Sul”. Seja bem-vindo;
– No alto da matéria: Tomada a partir do Xaxim, a vista clássica (eu quase diria “mundialmente famosa”) do Bairro Novo, que já fica no Sítio Cercado.
Trata-se da “Grande Planície Curitibana”, o coração/arquétipo mesmo da Zona Sul, sua essência mais pura.
– Em várias cenas acima, o “Novo Xaxim”, a parte mais aburguesada do bairro.
Em que a brincadeira do “Xaxim Social” já não é tão irônica.
Parece-se com os subúrbios de classe alta estadunidenses, e não é mera coincidência.
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Como é de domínio público, o Xaxim embora já urbanizado conservou até os anos 90 enormes extensões de terra desocupada.
Tinha verdadeiras fazendas urbanas. Literalmente, não é modo de falar.
Essa avenida, que veem em boa parte das imagens dessa mensagem, tinha chácaras com plantações mesmo já depois da virada do milênio.
Veja a direita acima a foto datada de 2003, no fundo era área rural.
Não mais. Agora aquela parte da cidade é ‘cidade’ mesmo, zona urbana de fato e direito. As lavouras se foram, como veem tudo mudou.
Surgiram diversos condomínios, horizontais e verticais igualmente
Vários outros estão em obras (texto de 2014) como foi registrado em diversas tomadas.
Aqui, o último grande lote, de 20 mil metros quadrados, está a venda.
Logo, tudo será cimento no que um dia, não muito distante, foi um enclave rural dentro da selva de pedra.
Onde veem esses sobrados artesanais na ladeira, a “Cidade da Laje”:
Agora sim, retratado está o Jardim Maringá, Xaxim.
Vimos mais pra cima na página uma cena do vizinho Jardim Itamarati, também no Xaxim.
– Banco improvisado no ponto de ônibus. Veja a mesma cena na Zona Oeste, e igualmente na Leste.
– Essa bela árvore já está no Sítio Cercado, “que será visitado outro dia”, eu escrevi.
O dia chegou logo, produzi uma matéria nos vizinhos bairros Alto Boqueirão e Sítio Cercado.
Pra fechar: conhecido informalmente como ‘Xaxim Social’ de forma irônica, o bairro já foi chamado, na época que era rural, de ‘Xaxim Cercado’.
Inclusive assim consta num mapa de 1953 que levanto pra rede.
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“DANÇANDO NA CHUVA” –
Agora uma mensagem que foi publicada em 2 de junho de 2018.
Pois também retrata um temporal. A moça saiu com um vestido branco.
Que molhado se tornou transparente. Pra piorar, o vento levantou a barra (acima).
Por sorte ninguém viu. Então ela pôde relaxar e chegar em casa ensopada, mas tranquila.
“FLORES AUSTRAIS” – clicadas no Xaxim, nesse chuvoso dia de maio de 2014.
“Deus Pai proverá”