Por Maurílio Mendes, “O Americano”
Publicado em 17 de maio de 2015
Há uma música famosa do ‘rap’ chileno chamada “América”.
É o Chile, caramba !!!!
Ninguém deixa de ser o que é.
E o Chile é América, de corpo e Alma.
(Nota: todas as fotos dessa matéria são da Grande Valparaíso, exceto uma.)
…….
Europeizaram a capital Santiago e a transformaram num xerox londrino, pelo menos urbanisticamente.
Sim.
Ainda assim, basta uma volta por sua outra capital Valparaíso – onde está o congresso – que você verá o quão pífia foi essa tentativa de abafar o sol com a peneira grossa.
Valparaíso é América Latina.
Tão Latina e tão Americana quanto uma cidade pode ser, e as imagens falam por si mesmas.
Em Valpo você se sente em Cali-Colômbia, La Paz-Bolívia, Caracas-Venezuela.
Ou quem sabe nos subúrbios da Cidade do México.
Valparaíso é onde o Chile se re-encontra com a América.
A esquerda uma panorâmica, clique pra ampliar, veja você mesmo que assim não será preciso explicar mais nada.
A cidade foi, como já disse algumas vezes, construída sobre 41 morros.
Os mais centrais são chiques, ligados com teleféricos a Cidade Baixa que é o Centrão.
E por isso abrigam gente descolada e de classe média em suas estreitas ladeiras.
Sabe uma versão sul-americana de São Francisco-EUA? É por aí.
Agora, na periferia, Valparaíso não é chique, e não é descolada.
Ao contrário, os morros estão favelizados, e milhares de casas se empilham precariamente nas encostas.
Isso quando não chove. Quando desaba água do céu, as casas desabam também.
E só do céu é que vem alguma esperança que um dia essa situação mude.
Veja o que eu já havia escrito sobre Val ainda em 2013, bem antes de ir lá fisicamente.
Mas após ter dado umas boas voltas pela cidade assim que o ‘Google’ a filmou no Visão de Rua.
Porque o governo chileno urbanizou intensamente a capital Santiago, que é onde mora o/a presidente do país.
No entanto o interior ainda aguarda esse melhoramento.
E olhe que Valparaíso também é capital, a capital legislativa.
Só que isso não bastou pra que o governo olhe com um pouco mais de carinho pra esse povo, e o resultado é o que está aí.
……….
O Chile é bi-polar, amigos. Apenas 130 km separam suas duas capitais.
E pela moderna auto-estrada duplicada chega-se rapidamente em 1 hora e meia.
Mas parecem galáxias diferentes, tamanha distinção social.
Porque em todos os países latinos que citei acima a coisa é complicada, mas é complicada por inteiro.
Não há essa bi-polaridade chilena, é o que estou tentando colocar.
………..
A periferia, e as vezes mesmo o Centro, de Acapulco, Tijuana, Monte-Rei e Guajdajara têm sérios problemas?
Assim o é, e no caso de Acapulco comprovei com meus próprios olhos.
Mas o subúrbio da capital México D.F. não é nem um pouco melhor, e em muitos casos chega a ser pior.
Porque o México é pobre, é de 3º mundo certamente, mas o é por inteiro, disso não restam dúvidas.
O mesmo ocorre na Colômbia. Medelím e Cali têm muitas favelas em morro.
E nas metrópoles do litoral (Cartagena e Barranquilla) há igualmente muita miséria, apenas ali é plano, não há encostas.
Só que, assim como se dá no México, a capital Bogotá não é tão diferente assim do interior.
A Zona Sul bogotana tem favelas em morro que fazem a Rocinha-RJ parecer pequena.
A coisa é realmente impressionante, e só quem esteve lá pode dimensionar o quanto.
A Zona Oeste é um pouco melhor mas tem pontos também bastante complicados.
Só a Zona Norte é que é de maioria de classe média (Bogotá não tem Z/L, pois há uma montanha a oriente do Centro).
O mesmo se dá aqui em nossa Pátria Amada.
O Plano Piloto de Brasília é realmente espetacular, “meu Deus, mas que cidade linda!!”, como o poeta definiu.
Agora, há partes das cidades-satélites (Estrutural, Itapoã, as quebradas da Ceilândia e Santa Maria, pra citar só alguns) são bastante depauperadas.
Alias nessa mesma música é narrada a saga dos subúrbios candangos.
Porque o Brasil é América Latina, e nossa capital não deixaria de expressar essa mesma sintonia.
………….
Vocês já sabem dessa situação, obviamente. Escrevi tudo isso pra apontar que no Chile não é assim.
Santiago é uma realidade a parte, mas em Valparaíso tudo ‘volta ao normal’, se é que se pode colocar assim.
VALPARAÍSO É A SEDE POLÍTICA DA REGIÃO METROPOLITANA;
MAS A ELITE PASSA AS FÉRIAS EM VINHA DO MAR –
Falemos um pouco da Grande Valparaíso, a segunda maior cidade do Chile.
Ela tem seu núcleo formado por Valparaíso mesmo e a vizinha e umbilicalmente ligada Vinha do Mar.
Do outro lado do morro há mais alguns subúrbios (agora conectados a orla por moderno metrô), sendo o mais importante deles o município de Vila Alemã.
Em Valparaíso está localizado o principal porto do país.
O que lhe confere a esse município o status de sede política da Região Metropolitana.
É de fato uma cidade portuária, por toda a periferia se vê carretas muito velhas.
O sustento de muita gente que trabalha puxando carga de e para os navios.
Você já esteve em Vicente de Carvalho, no Guarujá-SP? Valparaíso é morro, Vicente é plana.
Mas uma coisa é igual, há dezenas e mais dezenas de cavalos-mecânicos enfileirados nas ruas estreitas.
……….
Estive na Baixada Santista em 2005, já portanto na metade da primeira década desse milênio.
E a maioria ainda era dos velhos Jacarés laranjas da Scania, vejam vocês.
Uma década depois, em 2015, eu voltei a Vic. de Carvalho, Guarujá.
Agora os Jacarés já não são maioria, mas ainda infinitamente comuns. Fotografei vários.
Pois o bairro fica no entorno do Porto de Santos, e esse é o sustento da maioria das famílias da região.
(Não apenas em SP. Em Paranaguá-PR, já nessa década de 10 os Jacarés igualmente eram abundantes.)
Então, andando agora pelas ladeiras do bairro São Roque, em Valparaíso, eu me senti de volta a Grande Santos.
Alias a metrópole costeira paulista tem muito em comum com a metrópole costeira chilena.
Santos e Valparaíso são as sedes políticas, por abrigarem o terminal marítimo.
Entretanto os prédios melhores, a orla mais chique, está nos vizinhos municípios do Guarujá e Vinha do Mar.
Em Itajaí e Balneário Camboriú-SC há igualmente uma situação parecida.
Nas imagens: o Porto de Valparaíso com nossa bandeira na mesma imagem, tradição que se espalha pela América.
E a seguir mais carretas nos subúrbios da cidade.
Disse que há teleféricos ligando os morros que contornam o Centro ao baixada em Valparaíso.
Veja a esquerda, no subúrbio, bem longe dali, em morros que não são servidos por teleféricos, há grafites retratando-os.
Portanto mesmo os que não dispõem desse benefício o cultuam apenas por fazerem parte do ‘Espírito valparaisense’.
Pois bem. Agora veja esse bar ao lado: homenageando o tróleibus, que tem 70 anos e é outro símbolo da cidade.
Trata-se do único sistema de tróleibus em operação do Chile.
E de toda a América do Sul ao lado de São Paulo e Santos, Mérida-Venezuela, Quito-Equador e Córdoba, Mendonça e Rosário, as 3 na Argentina.
Retificação importante: anteriormente eu informei erroneamente que só há tróleibus no Brasil e Chile.
Peço perdão aos amigos do Equador, Venezuela e Argentina pela falha.
Pra compensar, produzi essa matéria em que mostro os ônibus elétricos americanos, de Valparaíso a Vancuver-Canadá.
Já fiz uma mensagem específica sobre os tróleibus chilenos, e outra sobre os brasileiros.
Uma terra em que os meios de transporte são muito queridos no coração de seus habitantes, elevados a símbolos da cidade. Valparaíso é assim.
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O curioso é que eles homenageiam apenas os meios de transporte antigos, que estão ali a há décadas.
Porque a Grande Valparaíso tem também moderníssimo metrô.
Que liga o Centro (a Estação Central é perto do porto) aos subúrbios, primeiro cortando a orla (em Valpo e na sequência em Vinha do Mar).
A seguir faz uma curva a direita, cruza o morro via túnel.
E conecta ao núcleo distantes municípios da Grande Valparaíso que ficam na face oposta da montanha, e são planos, sem encostas.
Falei de tudo isso – a rede de transportes e os subúrbios afastados – em mensagem a parte, incluso com muitas fotos.
Aqui é só uma pincelada pra apontar que o metrô é moderno.
E muito útil, usado pelos valparaiseneses diariamente pra ir e voltar do trabalho.
Mas não é homenageado em grafites e placas. É prático, e por isso utilizado no plano material.
Porém não é querido ao Coração, esse espacinho ‘no Recôndito da Alma’ abriga apenas os meios de transporte antigos, o trólei e o teleférico.
Valparaíso tem a Alma Retrô, saudosa de um passado que não volta mais, e por isso é eternizado nas pinturas que adornam as ruas.
A causa é que a cidade já teve dias melhores, economicamente falando. Beeem melhores. O Centrão é velho, em algumas partes sujo e confuso.
Há alguns bairros de classe média e média alta nos morros, mas são poucos.
A cidade é totalmente no padrão da América Latina, no geral.
………
E onde então moram os ricos da Grande Valparaíso?
Oras, no mesmo lugar que os ricos de Santiago passam suas férias de verão:
Na orla do vizinho município de Vinha do Mar.
Igualmente as imagens falam por si mesmas.
Os prédios da elite em Vinha tem um luxo e ostentação abertos.
Em Santiago não é assim, a cidade é muito rica, mas é uma riqueza mais discreta.
Na capital a elite não tem tanta necessidade de exibir seu dinheiro.
Mas quando desce a serra a coisa muda, ali é a ‘Beverly Hills’ chilena, e vale tudo.
O Centro de Valparaíso é apertado, velho e tumultuado, como a maioria dos Centros das metrópoles de 3º Mundo. Há muito poucos prédios altos residenciais.
O Centro de Vinha do Mar (a palavra ‘vinha’ se refere a fazenda onde se plantam uvas, e não ao verbo vir) é, exatamente ao oposto, novo.
Com amplas avenidas tomadas por espigões que ostentam belos jardins gramados adornados com espelhos-d’água, canteiros e cascatas.
Entretanto, leve em conta que Vinha do Mar tem o mesmo perfil topográfico que a vizinha Valparaíso, e portanto tem o mesmo perfil urbanístico-social:
O Centro é cercado por morros, os mais próximos são de classe média, conforme você vai se afastando as favelas tomam conta de tudo.
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CASAS DE MADEIRA E DE LATA, AS VEZES SAINDO PRA RUA: A PERIFERIA DO CHILE SE PARECE COM A DO BRASIL, ARGENTINA, ÁFRICA E ÁSIA –
No Chile há muita casa de madeira. Tanto quanto no Sul e Norte do Brasil.
Como Valpo é pobre e em morros, é cópia fiel de Almirante Tamandaré, na Zona Norte da Grande Curitiba.
Ou quem sabe a Lomba do Pinheiro, na Zona Leste de Porto Alegre-RS, quase divisa com Alvorada.
Como é notório pra quem esteve em Santiago as casas de madeira diminuíram muito com a intensa urbanização lá ocorrida, mas ainda estão presentes em bom número.
Na Argentina praticamente não há casas de madeira, exceto no estado das Missões e na Patagônia, ou seja nas pontas do país, sua periferia econômica e cultural.
Tratei desse tema com muito mais detalhes em outra postagem.
Aqui é só pra verem que nesse ponto o Chile se parece mais com o Brasil, com quem ele não faz fronteira.
Do que com a Argentina, com quem o Chile compartilha uma fronteira de nada menos que 5,1 mil km.
Mas isso não é tudo. Muito comuns na periferia do Chile também são casas de alvenaria muito humildes, com saída direto pra rua. Na Argentina igualmente.
Aqui os vizinhos são próximos não apenas física mas espiritualmente da mesma forma. E o mais curioso: no Nordeste Brasileiro é igual.
Tudo isso já disse antes. Então vamos pra parte que eu ainda não disse.
Nas partes pobres da Argentina há umas poucas casas de latão.
Muito mais raras que no Chile, mas ainda se acham algumas isoladas.
Faça uma voltinha ao redor do estádio do Boca Júniors na Zona Sul de Buenos Aires.
Algumas partes do Bairro da Boca, que nomeia o time, pouco mudaram em mais de um século:
Ainda tem gente que mora no latão, em pleno século 21. É uma forma de tortura.
Pelo metal ser condutor térmico, a casa fica gelada no inverno, e um forno no verão.
Mas ainda é a realidade de alguns argentinos que não tem recursos financeiros.
Pois bem. No Chile também é assim. E muito mais que na Argentina.
Já que no Chile as moradias em zinco ainda existem aos montes. Mesmo no Centro, e muito mais nas favelas e periferias.
Em graus diferentes, compartilham ainda esse modal precaríssimo. É outro ponto em que os vizinhos são de fato irmãos.
Já retomamos o texto. Antes uma pausa pra mais cenas da orla de Vinha do Mar, o balneário da elite chilena.
Na América, entre todos os países que já visitei e também que o ‘Google’ já filmou, só Chile e Argentina tem casas de latão, vejam só.
No Brasil não existe esse modal, louvado seja Deus, porque é desumano.
No Paraguai tampouco, e olhe que esse vizinho menor nosso luta pela sobrevivência, não tem a opulência de seus vizinhos.
No México, Colômbia e República Dominicana há algumas, mas raríssimas.
Só nas piores partes das piores favelas, mesmo na periferia fora da favela não há, e no Centro então nem pensar.
O Peru já está filmado e constato que a situação é a mesma.
No Chile, entretanto, é bem comum, mesmo em partes degradadas do Centrão.
Na Argentina já vi pelo ‘Google’, existe, mas bem menos que no Chile.
Sabe onde os pobres também moram em casas de latão? Na China e África do Sul.
………
Tudo somado: no subúrbio das cidades chilenas há casas de madeira e zinco, além da alvenaria.
Independente do modal, muitas vezes há muros e quintal.
Mas também é frequente a porta sair na via pública, sem quintal.
Ilustrando a realidade, fotos do subúrbio de Valparaíso.
Acima moradia de madeira ao lado de outra de compensado, saindo direto na rua. A direita em escala maior.
No Chile as periferias do Brasil, Argentina, África e Ásia se encontram.
Um Portal Inter-Dimensional.
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Minha estada no litoral do Chile foi brevíssima, apenas um dia e meio.
Considerem que no único dia que passei inteiro lá de manhã eu fui a praia e de tarde a um jogo de futebol.
Assim sobraram pouquíssimas horas pra andar pela cidade.
Por isso, da periferia só tenho fotos do entorno do bairro que fiquei hospedado em Valpo e de um morro mais central em Vinha.
Logo que chegamos subimos o teleférico, onde tirei as fotos do porto, inclusive a com o estandarte da Pátria Amada.
A seguir peguei o metrô e fui aos subúrbios distantes e planos do outro lado do morro, saga que será melhor contada depois.
No dia seguinte fomos a praia. Pra isso é preciso ir a Vinha do Mar.
Valparaíso tem litoral mas não tem praia, boa parte da orla está ocupada pela porto e o resto é rochosa.
Só dá pra entrar no mar em Vinha no auge do verão, dezembro e janeiro.
No outono e primavera já é impraticável, o mar é indescritivelmente gelado.
Porque o litoral chileno é cortado por uma corrente fria antártica.
E no inverno as águas do Pacífico Sul naquele trecho lembram as da Rússia.
Fomos no outono. É tão frio, mas tão frio, que você não consegue andar descalço pela areia na parte que ela está molhada.
É preciso buscar a parte seca pra não parecer que está com os pés dentro de uma geladeira.
E isso que o dia estava claro, de sol sem nenhuma nuvem, como as imagens mostram.
Alias, na Cidade do Cabo/África do Sul, é o mesmo, e pelo exato mesmo motivo, uma corrente fria que sobe do Polo Sul.
Voltando ao Chile, o tempo seco é o padrão ali. O país é árido, na semana que fiquei lá não choveu uma gota sequer.
É a primeira viagem que faço que isso acontece, em todas as outras (e já foram algumas, pelo Brasil e América) sempre chove pelo menos uma vez.
Em Belém-PA choveu todos os dias, cheguei e saí da cidade sob temporal.
Fiquei encharcado também em Belo Horizonte-MG (“A Vida no Morro”, parte 1), no Paraguai e na Colômbia.
E mesmo em Fortaleza-CE, que no geral é bem seca, eu tomei um pouco de chuva.
No Chile não foi assim. O Norte do país é deserto, alias um dos mais áridos do planeta.
O Centro, onde estão as duas capitais, há um pouco mais de umidade no ar, mas não muito.
Veja a foto ao lado. Essa tomada é em Santiago:
Todos os dias nos fins de tarde caminhões-pipa da prefeitura agoam a vegetação dos canteiros de praças e avenidas, pra que ela não pereça desidratada.
Acima é a única foto que é de Santiago, todas as outras dessa matéria são da Grande Valparaíso, não custa enfatizar ainda mais uma vez.
Santiago tem clima ameno. Quando fomos lá (março de 15) a temperatura estava bem agradável, tanto de dia quanto de noite.
Porém, por ficar entre montanhas o problema da poluição atmosférica é seríssimo.
Já a Grande Valparaíso é um gelo. Não apenas a água do mar. A cidade idem.
De manhã cedinho e a tarde todo mundo se cobre de casacos da cabeça aos pés, e isso que estávamos no outono.
Imagine como é o inverno. Tudo por causa da corrente fria do Pacífico.
………..
Já retomamos o texto. Vamos ver várias cenas do Morro no bairro São Roque, em Valparaíso.
Lhes disse, por falta de tempo esse foi o único que pude conhecer em profundidade.
Nos outros bairros os morros são iguais, tomados de favelas nas encostas exatamente como esse.
Iniciamos pela cena a esquerda. E agora a sequência horizontal.
Várias vezes há a mesma tomada em escalas diferentes. Pra vermos tanto o panorama geral quanto os detalhes.
Vimos várias casas de madeira e metal, afinal estamos no Chile.
Voltando a falar de nossa ida a praia chilena. Vimos que o mar é gelado já caminhando na areia.
Quando nos estabelecemos em um ponto fui pra dentro d’água.
Afinal era minha primeira e provavelmente nessa encarnação última chance de ficar imerso no Pacífico Sul.
Então eu afundei no oceano. Rapidamente. A seguir de novo.
Após essas duas rápidas mergulhadas fui pra areia, de onde não saí mais.
Foi o suficiente. É frio demais. Demais, demais mesmo.
Não há qualquer paralelo com o Brasil, nem mesmo com a parte austral da pátria, que é onde vivo.
O litoral Sul-Brasileiro é bem gelado no inverno de fato.
Mas muito menos que no Chile, não há qualquer comparação possível.
Aqui no inverno não dá pra entrar mesmo no mar.
Mas nos dias mais quentes de outono e primavera dá tranquilo.
E no verão a água é bem quente. No Chile apenas no pico do verão ela fica suportável, ainda assim bem fria.
……….
Foi como se revivêssemos o filme ‘Os Pássaros’ na orla chilena.
Então vambora falar de volta da cidade de Valparaíso.
Lembra muito Acapulco, muito mesmo. São cidades-gêmeas ‘separadas no nascimento’:
A topografia é praticamente idêntica, parece que o Criador quando foi materializá-las pegou o mesmo projeto e apenas adaptou os detalhes.
Ambas surgiram entre um arco de montanhas que protege uma baía.
Na parte plana está o Centro da metrópole.
Elas já tiveram dias bem mais luminosos em termos econômicos.
Então com a decadência a elite saiu da cidade e foi morar em subúrbios, visitando a área central só pra trabalhar.
Ou nem isso, muitas vezes a moda estadunidenses já surgiram mesmo centros corporativos e comerciais afastados do povão que pulula no núcleo velho da metrópole.
Ele é, digo ainda mais uma vez, barulhento, apertado, velho, em alguns pontos sujo.
E, isso eu ainda não disse, tomado de camelôs, nos dois casos.
Sério: Valpo e Acá (pra usar os apelido carinhosos delas) parecem um mercado persa, no Centrão.
As fotos são auto-explicativas – nessa matéria viu as do Chile.
As matérias sobre o México já estão no ar (essa é a Abertura da série, onde há ligações pra todas as outras).
…..
Em Santiago há muitos camelôs também, mas apenas nos bairros periféricos.
Em outra mensagem seguem as fotos, mato a cobra e mostro o pau.
No Centro não há tanto esse problema de ambulantes tomando as calçadas.
De forma que muitos pensam que ele não existe.
Bem, não só na questão do comércio informal.
Santiago tem muita miséria, mas é bem longe dos olhos.
E portanto longe da mente das pessoas também.
No subúrbio o bicho pega e pega feio, o sistema é bruto.
Mas, como diz outra música, ‘só quem é de lá sabe o que acontece’.
Eu estive lá, e vi, e agora relato a vocês esses fatod.
Mas como a imensa maioria das pessoas não vai pros arrebaldes da metrópole, a coisa fica meio encoberta.
…………
Em Valparaíso esse auto-engano não é possível.
As consequências da desigualdade social estão a vista de todos, a luz do dia, no coração da cidade.
Bem ao lado das portas do Congresso que representa o povo chileno, repare o que acontece:
Uma parcela considerável desse mesmo povo luta apenas pra sobreviver materialmente.
Da forma que seja possível por mais precária que seja, como é na Nigéria e Haiti.
As duas imagens (a mesma em escalas distintas) logo acima foram feitas na região.
E as calçadas ao redor são tomadas por camelôs, obviamente pessoas que não têm emprego e fazem o que podem pra levar dinheiro pra casa.
Valparaíso É América. Não dá pra negar ou maquiar.
…………
Mais um intervalo pra fotos.
Agora vamos ver Vinha do Mar, na Grande Valparaíso
Já começamos por essas 3 panorâmicas, ao lado e acima.
Muitas casas de madeira e de metal, afinal isto é Chile.
A subida do morro, e a vista do Centro lá de cima.
Repare na casa ao lado (ainda falamos de Vina do Mar, lembre-se:
A garagem é no nível da rua. E o chão dela está muito acima do teto da casa.
Isso que é um sobrado. Por aí se calcula a inclinação do morro, o quão aguda!
É a realidade da Grande Valparaíso, é a realidade de boa parte da América.
…………….
De volta ao texto. Já disse antes e direi de novo:
Na classe média o Chile é muito parecido com a Argentina.
Talvez a média e alta burguesia espanhola que tenha vindo povoar os dois países vizinhos seja oriunda de um extrato homogêneo.
Semelhança que foi reforçada depois quando ambos receberam grandes levas de italianos, ingleses e alemães.
No Sul do Brasil também houveram muitos imigrantes italianos e alemães, e em SP italianos.
Agora, pra nossa Pátria quase não vieram ingleses.
Pra Argentina e Chile foram muitos, muitos mesmo. O que uniu esses países entre si.
Porém no subúrbio, no povão, o Chile é muito parecido com Peru e Colômbia.
E completamente distinto da vizinha Argentina. E a linguística é a prova.
Quem fala castelhano sabe, quem não tem essa habilidade vai saber agora.
Há 3 formas de pronunciar os dois ‘L’s nesse idioma. Vou exemplificar pela palavra ‘llave’:
– Os espanhóis falam como se lê, ‘lhave’ (como se fosse nosso ‘lh’), uma pronúncia parecida com ‘liave’.
– Os pratenses (argentinos e seus vizinhos paraguaios e uruguaios) dizem ‘chave’, e aí fica igual falamos no português, eles leem o ‘ll’ como nosso ‘ch’.
– No Norte da América do Sul (Equador, Colômbia, Venezuela) e América Central (México incluído) fala-se ‘jave’, como se fosse nosso jota.
Pois bem: no Chile também se diz ‘jave’
Me ative a primeira sílaba, a que distingue os sotaques hispânicos entre si.
Quanto ao final da palavra, sabem que não existe a pronúncia de ‘v’ em espanhol, fala-se como se fosse ‘b’.
Resultando que na verdade se diz ‘liabe’, ‘chabe’ ou ‘jabe’.
…………..
A cidade de Barranquilla, Colômbia. Os espanhóis, que a fundaram, falam ‘Barranquília’.
Os argentinos e vizinhos (Paraguai e Uruguai) dizem ‘Barranquícha’.
Já o povo que lá habita, os colombianos, denominam essa metrópole costeira de ‘Barranquíja’.
Os chilenos também dizem ‘Barranquíja’.
O mesmo vale pra letra ‘Y’ seguida de vogal. Os espanhóis falam como se lê.
Os pratenses como se fosse ‘ch’. Os Centro-Americanos, e também os chilenos, como ‘jota’.
“Yo Soy . . .”:
– Europa: “Dio Soy”.
– Prata: “Cho Soy”
– México, Colômbia, Venezuela, Equador e Chile: “Jo Soy”
……….
E isso também em Santiago, claro. A capital chilena passou por uma reforma urbana espantosa nesse último quase meio século.
De fato impressionante, transformou uma cidade latino-americana em europeia.
Mais que europeia, norte-europeia, ou seja inglesa. Vendo fisicamente sua periferia, Santiago é uma cidade normanda. Na matéria.
Ainda que impressionante, foi feito, porque é possível construir centenas de milhares, ou mesmo milhões, de moradias geminadas em conjuntinho.
Mas o sotaque de um povo você não muda, porque você não muda a Alma dele.
Pois em espírito Santiago é Americana. E como é. Em outra postagem dou todas as provas, em múltiplas dimensões.
…..
Na língua é assim também. Distante da vizinha Argentina, e de mãos dadas com México, Venezuela, Peru e Colômbia.
Que estão longe na matéria, mas perto no coração.
Santiago é Europa na matéria, América na Alma.
Valparaíso não está em cima do muro.
Valparaíso É América. De corpo e Alma.
“A Vida no Morro”.
América, América.
Como eles dizem no Chile:
“América explorada e ferida.
Invadida por colonos que não eram bem-vindos.
E a falsa religião a morte apoiou.
América, de pele morena e cabelo preto.
Eu te respeito, e te Amo.
Sentimento”.
………..
Assim É.
Dos morros de Medelím aos morros de Acapulco
até os 41 morros de Valparaíso:
Eu Sou O Americano.
“Amor Maior”.