Por Maurílio Mendes, O Mensageiro
Publicado em 13 de outubro de 2020
Mensagem-portal da viagem ao Rio de Janeiro. No fim da matéria ancoro as demais reportagens, a série foi toda publicada.
Quase todas as fotos de minha autoria. As que forem baixadas da internet identifico com um ‘(r)’, de ‘rede’.
……..
O que falar da “Cidade-Maravilhosa”?, já tão cantada e decantada em verso e prosa…
Ainda assim aceito o desafio, e farei uma série de matérias relatando o que observei nesses quase 6 dias que passei no Rio.
UMA CIDADE ABSOLUTAMENTE MARAVILHOSA; MAS . . . SOB OCUPAÇÃO MILITAR –
Sabe o Yin-Yan, aquela bola metade escura e metade clara em que as metades se entrelaçam?
É o Oráculo-Mor do Universo, e se isso fosse possível resumiria numa imagem como as Leis da Energia (que regulam toda a Vida, em todas as dimensões) funcionam.
“O Preto e o Branco vem juntos”, o que quer dizer que as partes boas e ruins muitas vezes caminham lado-a-lado.
Funciona assim sempre, mas em nenhum lugar esse contraste é tão óbvio quanto no Rio.
Não estou contando o segredo do Santo Graal, estou?
Como diz a música Rio 40º, é a “capital do melhor e do pior do Brasil”.
Acho que não poderia haver melhor definição que essa.
Então isso é o que mais chama a atenção no Rio de Janeiro:
Um lugar deslumbrante, espetacular, a própria “Cidade-Maravilhosa” mesmo e não poderia haver outra.
Por outro lado, com problemas gravíssimos de segurança pública. Bota ‘gravíssimos’ nisso.
Alias essa parte já se deteriorou tanto que os tumultos se tornaram crônicos, ou seja permanentes.
Em setembro de 2020, quando lá estive, o que vi foi uma cidade sob ocupação militar:
Uma força-tarefa que reúne duas esferas – municipal e estadual – satura as Zonas Sul e Central de polícia.
(Nota: não tive tempo de ir a Zona Norte infelizmente, e na Zona Oeste só estive na Praia da Barra.
Então sinceramente não sei como estava a situação no subúrbio.)
Seja como for, o que presenciei já foi bastante impressionante.
Viaturas ocupam todas as partes da Zona Sul, o tempo todo, e no Centro a presença também é intensa.
Pra tentar reduzir, temporariamente que seja, os assaltos e tiroteios entre traficantes, que tiveram grande explosão no inverno de 2020.
Quando preciso, até a esfera federal – as Forças Armadas – também participa dos cercos as favelas, como nota na imagem a direita.
Fiz outra matéria, falando mais especificamente sobre essa situação.
Por hora, vamos dar um panorama geral da cidade e no decorrer da série nos aprofundaremos na questão da (in)segurança pública.
………
Trata-se, como todos sabem, da 2ª maior cidade do Brasil.
O Grande Rio tem pouco mais que 12 milhões de habitantes.
(Foram contados 11,7 milhões no Censo de 10, a projeção pra 2020 é de 12,7. Logo teremos os resultados do Censo de 2020.)
Somente na capital, o município do Rio, são 6 milhões de pessoas (6,3 no censo, 6,7 é a projeção pra 2020).
O Rio de Janeiro é de um espetáculo natural indescritível.
E eu diria mesmo “incomparável”, em escala global.
Tudo isso por boa parte da cidade – e certamente nos seus bairros mais caros – ficar espremida entre a serra e o mar.
No meio da cidade há uma grande cadeia de montanhas, o Maciço da Tijuca. Eis a glória do Rio, que lhe confere sua beleza singular.
Os dois símbolos maiores do Rio estão no alto de morros: me refiro, evidente, ao Cristo Redentor no Corcovado e o bondinho no Pão de Açucar.
O imponente Cristo pode ser visto pela maior parte da cidade (na África do Sul a Cidade do Cabo tem a Mesa-Montanha, que cumpre o mesmo papel; bem, como o Rio o Cabo é outra cidade linda mas cheia de problemas e contrastes sociais).
Nada mais natural, posto que a montanha do Corcovado que o sustenta tem 750 metros de altura.
Fotografei-o em diversos pontos da Zona Sul (infelizmente o tempo foi curto e não pude visitar a Zona Norte, como já informei).
Por outro lado, de certa forma essa geografia é também uma provação.
Não é difícil entender o porquê. A cidade fica muito quente, falando de forma literal e também figurada.
Fisicamente no subúrbio do Rio faz muito calor, pois ele está numa espécie de estufa entre duas cadeias de montanhas:
O Maciço da Tijuca quase a beira-mar e a Serra do Mar um pouco mais adiante, no alto da qual ficam Petrópolis, Teresópolis, Nova Friburgo, etc.
A orla ainda é mais fresca, pois recebe a brisa marítima que alivia o calor.
Mesmo assim quando estive lá em alguns dias a temperatura beirava os 35º – olhe que oficialmente ainda estávamos no inverno, afinal a primavera começa no dia 22 de setembro.
No entanto, o subúrbio carioca é muito, mas muito quente. Justamente pelo que acabo de dizer acima, ele se localiza entre 2 serras.
Isso causa uma estufa que faz com que os termômetros fervam. Um mês depois disso, em outubro de 20, o calor chegou a nada menos que 43º!!!
Segundo diz quem morou nas duas cidades, o Rio é mais quente que Salvador-Bahia (cidade sobre a qual também visitei e estou publicando uma série de matérias).
Aliado a isso, há também uma situação social explosiva. Todos sabem, novamente não vou contar nenhum segredo.
A encosta dos morros foi ocupada de maneira completamente desordenada. Com isso, o Rio tem favelas em quase todos os bairros.
A princípio eu havia escrito “com exceção talvez da Urca”. Só que mesmo a Urca tem uma pequena favela na divisa com Botafogo.
(Embora a Urca seja segundo alguns o bairro mais seguro do Rio, questão que me aprofundarei outro dia.)
Não tem jeito, são praticamente onipresentes. No Centro, na orla, ao lado dos bairros mais ricos, ou seja, por toda parte.
Duas notas: 1) como já disse muitas vezes, eu não falo ‘favela’ com desprezo burguês. Gosto de periferia, e gosto das favelas.
Não sou de direita. Sei muito bem, na prática inclusive, que a imensa maioria das pessoas que moram em favelas e periferias são honestos e batalhadores.
Agora, também não sou de esquerda. Então não vamos tapar o sol com a peneira.
Eu me recusei a substituir o termo favela por ‘comunidade’.
Sim, desse modo manda o dogma de uma estranha ‘novilíngua’.
Dogmas esses que hoje predominam na academia e boa parte da mídia.
Ainda assim, quando escrevo “comunidade”, o faço sempre entre aspas.
Pra indicar que é um sinônimo da palavra ‘favela’, e não seu sucessor.
Eu gosto de favelas e periferias. Ainda assim, repito, não tapemos o sol com a peneira.
A presença de favelas em todos os bairros da cidade é uma situação altamente explosiva.
Não preciso explicar isso pra ninguém, e muito menos pros cariocas.
E assim de fato se dá. A cidade ferve, não apenas nos termômetros que medem a temperatura física, mas também em termos sociais.
2ª nota: é claro que Curitiba também tem favelas. E como as têm!
No município da capital do PR são cerca de 300, e eu conheço todas elas, uma por uma.
Não apenas no mapa mas por dentro, andando em suas ruas e becos.
Curitiba não é Europa, muito longe disso – e olhe que a Europa também tem suas próprias favelas e seus problemas sociais crescentes.
Seja como for, a capital paranaense é uma metrópole da América Latina, como tudo que isso acarreta.
Aqui há desigualdade social, as vezes aguda. Há violência urbana, evidente.
Em julho de 2020 eu e minha companheira inclusive sofremos um assalto na Zona Norte.
Então em Curitiba e todas as cidades brasileiras e podemos dizer em boa parte do planeta a questão da violência urbana é aguda.
Curitiba tem centenas de favelas, em diferentes graus de urbanização.
E ocorrem assaltos frequentes por toda cidade, Centro, burguesia e periferia.
Agora, e esse é o ponto, aqui a periferia é, bem, na periferia. Na periferia geográfica da cidade.
Bem longe óbvio da Região Central que concentra a classe média-alta.
A capital paranaense tem duas grandes antigas favelas perto do Centro, Vila Parolin e Vila Capanema.
Agora foram urbanizadas, mas alguns problemas permanecem.
A questão da violência certamente é uma delas. É o Brasil, amigos.
No geral, entretanto, as favelas de Curitiba são distantes do Centro.
E embora algumas delas sejam em ladeiras (a começar pela Vila Parolin supra-citada), nenhuma delas é em encosta de montanhas.
Em São Paulo, Brasília-DF e muitas outras cidades, o mesmo se repete.
(Digo, na Zona Norte de Sampa há algumas favelas na encosta da montanha, no caso a Serra da Cantareira.
Só que são bem afastadas do Centro e dos bairros mais caros.)
Há gravíssimos problemas sociais, evidente que sim. Quem tentaria negar?
Entretanto os bairros mais “quentes” da cidade (se é que me entendes) ficam nos arrebaldes, “longe dos olhos, longe do coração”.
No Rio, e também em Florianópolis-SC, Santos-SP e Vitória-ES, é diferente.
Nessas 4 cidades, todas no litoral do Atlântico (fora o Rio alias as outras 3 são ilhas), há uma grande cadeia de montanhas no centro – geográfico – do município.
Assim, os bairros ocupam a área plana disponível entre os morros e a água.
Além disso, várias encostas estão bastante favelizadas.
O que faz com que existam favelas na orla, em alguns casos quase na beira-mar mesmo.
Voltando a falar especificamente do Rio de Janeiro, que é nosso foco hoje.
Praticamente todos os bairros da cidade têm grandes favelas.
Seja nos morros (na região das Zonas Sul, Central e boa parte da Norte) ou planas (na Zona Oeste e alguns pontos da Norte).
Se tudo isso fosse pouco, o Rio de Janeiro, como não é segredo pra ninguém, tem um problema gravíssimo com o enraizamento de facções criminosas nos morros, favelas e periferias.
O problema vem desde os anos 80, e pelo andar da carruagem não será solucionado tão cedo.
Tomemos por exemplo o bairro de Copacabana na Zona Sul.
Antigamente, no meio do século 20, era a parte mais cara da cidade, ao lado da vizinha Ipanema.
(Isso antes da ascensão da Barra da Tijuca, na Zona Oeste, como reduto da classe média-alta e elite.)
A questão é que boa parte da burguesia foi pra Barra, mas ‘Copa’ ainda retém o status de um bairro de classe média e média-alta.
Ainda que a maior parte dos que têm mais dinheiro já tenha preferido migrar pra condomínios fechados com maior segurança na orla da Zona Oeste.
Igualmente, falamos melhor sobre a Barra em outra ocasião. Por hora, fiquemos em Copa.
Mesmo sem a hegemonia do passado, ainda é um bairro caro.
Comparado com a Zona Central e os subúrbios das Z/N e Z/O certamente.
Pois bem. A ponta de Copacabana mais próxima do Centro é a Praia do Leme, como sabem (“Do Leme ao Pontal” da música famosa).
No Leme, praticamente a beira-mar, está a favela dos morros Babilônia e Chapéu-Mangueira.
(Sim, o nome é derivado do Morro da Mangueira na Zona Norte.)
No meio de Copa, dessa vez um pouco afastado da praia, temos outro complexo de favelas na encosta, o Morro dos Cabritos/Ladeira dos Tabajaras.
E na divisa com Ipanema há mais um morro com uma grande favela, a maior das 3 de Copa, o morro do Cantagalo/Pavão-Pavãozinho.
Sendo que a Babilônia/Chapéu-Mangueira e Cantagalo/Pavão-Pavãozinho podem ser vistas até mesmo das areias da praia.
E também da maior parte das ruas próximas. Uma realidade que não pode ser ignorada.
Além do mais, se você for da orla da Zona Sul (Copacabana, Ipanema/Leblon) pra orla da Zona Oeste (Barra/Recreio dos Bandeirantes) terá que passar perto dos morros do Vidigal e Rocinha.
Babilônia/Chapéu-Mangueira, Cantagalo/Pavão-Pavãozinho e Cabritos/Tabajaras são favelas entre médias a pequenas.
Ou seja, têm alguns milhares de moradores em cada uma delas.
Já a Rocinha e o Vidigal são favelas bem grandes. Grandes mesmo.
O Vidigal tem algumas dezenas de milhares de habitantes.
E a Rocinha é ainda maior, quase de uma centena de milhar.
Nota: são comuns os relatos totalmente descabidos que a Rocinha teria, sozinha, ‘meio milhão de habitantes’.
Trata-se de um despropósito óbvio. A população total do município do Rio é de 6 milhões.
Então basta você olhar no mapa e ver a área que a Rocinha ocupa em relação ao total.
Assim ficará evidente que não é possível que a Rocinha concentre quase 10% dos cariocas.
Não é possível, e dizendo de novo, uma simples mirada no mapa deixa isso cristalino.
Muitos brasileiros têm problema crônico com os números.
E o desarranjo no relato de quanta gente mora nesse morro demonstra isso.
No censo de 10, o IBGE contou 69 mil pessoas vivendo na Rocinha.
Um ‘censo das favelas’ do governo do estado fixou o número um pouco acima, perto de 100 mil.
São por volta de 30 mil moradias na Rocinha, logo algo entre 70 a 100 mil moradores fica perto da realidade.
No entanto, a Rocinha não tem ‘200, 300 ou mesmo 500 mil habitantes’, como alguns falam sem atentar pra consequência de suas palavras.
Convenhamos, entre 70 a 100 mil moradores não é pouca coisa.
Trata-se ainda de uma das maiores favelas do mundo, a segunda maior do Rio.
Atrás do Complexo da Maré na Zona Norte que abriga perto de 120 mil pessoas.
Há duas formas de ir da Z/S a Barra, e por qualquer uma deles você terá que passar na frente do Vidigal ou da Rocinha:
1) Pela Av. Niemayer, que segue ao lado da praia e até mesmo sobre ela em alguns pontos (é um elevado, um grande viaduto, pra quem não conhece).
Nesse caso você irá cruzar o Vidigal, até porque é a via de acesso a favela.
2) Via Auto-Estrada Lagoa/Barra. Nesse caso, após o túnel Zuzu Angel você sai na Rocinha.
Sim, a maior parte da favela você não vê, pois ela está sobre o morro que o túnel corta por baixo.
No entanto, mesmo o finalzinho da Rocinha, que você vê quando sai do túnel, já é bastante impressionante.
Mais uma vez repito, praqueles que têm sua mente bem lavadinha pelas ideologias em voga na academia/mídia possam entender:
Eu gosto de periferia, e gosto de favelas. Não falo com desprezo pela Rocinha, e nem por nenhuma favela.
Ainda assim, as coisas são como são, e não como gostaríamos que fossem.
Favela é favela, chamá-la de “comunidade” não ameniza essa dura realidade.
A Rocinha é uma favela, e isso não deixa de ser reparado por quem passa ali.
Ao menos pelo 99% das pessoas que não estão tão atreladas aos dogmas pregados com fervor religioso na “comunicação” e “educação” (entre aspas por algum motivo, deixo pra você decifrar).
E é impressionante passar pela Auto-Estrada e ver ali a Rocinha, ‘em toda sua Glória e Poder’ se podemos chamar assim.
Ocupando lugar de destaque entre os bairros mais caros do Rio de Janeiro.
………
Além disso, a composição racial do Rio de Janeiro é mais parecida com a de Minas e boa parte do Nordeste.
Ou seja, com uma proporção mais alta de negros e mulatos.
Não vai aqui nenhum racismo, ao contrário. Amo a Raça Negra Original.
Já fui a África e também a República Dominicana (que é a “África na América“).
Nunca fui a Europa e nem mesmo ao Uruguai – e ele faz fronteira com o Sul do Brasil, onde vivo.
(Esse país, embora tenha uma minoria negra significativa, certamente é mais associado a raça branca.)
Essas viagens que fiz são uma representação de minha Alma.
Então, enfatizando ainda mais uma vez e quantas se fizerem preciso, não vai aqui nenhum racismo.
Ainda assim, é evidente que existe um contraste entre Sul x Sudeste/Nordeste.
Óbvio que a composição racial do Rio (e também de Minas, Pernambuco e muito mais da Bahia e Maranhão) é bem distinta da capital do Paraná, onde eu morei toda minha vida.
Não é um juízo de valor, vamos entender bem esse ponto.
Não é questão de eleger um modelo como melhor ou pior.
Nosso país, e o mundo todo poderíamos acrescentar, está cego por uma intensa polarização arraigada.
Polarização política enorme, que ultrapassa os limites do ódio, e está agravando todos os conflitos, que já não são pequenos.
A extrema-direita cultua a raça branca normanda, enquanto a extrema-esquerda cultua a raça negra africana.
Vamos nos manter neutros nesse confronto. Curitiba não é melhor ou pior que o Rio, BH, Recife-PE, Salvador da Bahia e São Luís do Maranhão por ter uma composição racial distinta.
Entretanto, é diferente, sem dúvidas. Só que Curitiba (e boa parte do Sul em geral) que são a exceção, com sua população majoritariamente de pele mais clara.
(Um adendo: embora o que chamamos ‘brancos’ no Brasil são – e somos, porque me incluo nessa conta – mulatos-claros.
Os ‘brancos’ do Brasil e América Latina quase todos não seríamos brancos nos EUA, Europa Ocidental e Anglosfera.
E com razão. Porque não somos brancos, no sentido de normandos/arianos.
Somos Latinos. Somos América, América Latina.
E os Latinos não somos brancos, mesmo os que temos a pele mais clara).
Você entendeu. No Hemisfério Norte os ‘brancos’ brasileiros são outra raça, os Latinos.
Ainda assim, o que aqui no Brasil se classifica como ‘branco’ é ampla maioria no Sul,
Embora certamente hajam minorias negras/indígenas significativas.
No Rio não é assim. O Rio é uma cidade mestiça por natureza, com os negros com uma proporção alta da população.
Em verdade diria que o Rio é uma cidade de maioria mulata/mestiça.
Na orla os brancos são majoritários, nos morros os negros se não são maioria são quase.
Perguntamos então: e no subúrbio, que afinal é que concentra pelo menos 2/3 da população carioca?
Bem, nos subúrbios das Zonas Norte e Oeste o tipo majoritário é o que mistura o sangue das raças-formadoras da Pátria Amada.
Como diz outra canção: “Uns de pele clara, outros mais escura. Mas todos viemos da mesma mistura”.
E já que o tema é a música, pense no cantor Marcelo D2, que foi vocalista da banda ‘Planet Hemp‘ e depois partiu pra carreira-solo.
Se tivesse que escolher o carioca típico numa imagem, o biotipo majoritário, seria o D2.
Um mulato de pele clara, a ‘Cara do Rio‘. O Rio é assim.
Muitos negros, e maioria mestiça. Ali, os brancos é que são a minoria.
Conhece a música “A Cara do Brasil”? – gravada, entre outros, por Ney Matogrosso.
Ela fala dos múltiplos contrastes dessa nação-continente.
O Brasil em preto-&-branco. Pergunta a letra dela (eu mudei a ordem das estrofes):
“ O Brasil é o que tem talher de prata?
Ou aquele que só come com a mão?
Ou será que o Brasil é o que não come?
O Brasil gordo na contradição?
O Brasil é o homem que tem sede?
Ou quem vive da seca do sertão?
Ou será que o Brasil dos dois é o mesmo?
O que vai e o que vem na contramão?
Me bateu a pergunta, meio a esmo: na verdade, o Brasil o que será?
São os Trens da Alegria de Brasília?
Ou os trens de subúrbio da Central?
Qual a cara da cara da nação? ”
E assim vai. O autor vai desfilando as múltiplas contradições.
Não esquecendo nem do futebol, comparando as seleções nas Copas de 82 – que jogou bonito e perdeu – e de 94 – que jogou feio e ganhou.
(Breve explicação pra quem não é muito ligado nesse esporte, ou então é muito novo e não presenciou:
Tanto o Brasil de 82 quanto o de 94 fez seu último jogo na Copa contra a Itália.
Em 82, na Espanha, fomos eliminados perdendo por 3×2 num jogaço memorável.
Já em 94 a decisão do título Brasil x Itália foi o 1º 0x0 da história numa final de Copas do Mundo.
O Brasil acabou vencendo nos pênaltis e levou a taça.)
Já basta de futebol. Dei essa pincelada no esporte só pra pôr no contexto.
Voltemos a falar das disparidades sociais, que são o foco tanto da música quanto desse texto.
A certa altura, Ney Matogrosso fuzila, perguntando afinal qual é a ‘Cara do Brasil‘:
“ Quem vê, do Vidigal, o mar e as ilhas?
Ou quem das ilhas vê o Vidigal? ”
……..
Pois bem. Fui da Barra a Copa de ônibus, passando portanto perto da Rocinha e aos pés do Vidigal.
Houve um momento de tensão, quando alguns meninos da uma dessas favelas invadiram o ônibus.
Eram meninos mesmo, bem crianças, e ao levarem uma dura do motorista não criaram problemas. Depois eu conto essa história melhor.
Aqui, pra resumir, eles queriam apenas uma carona pra Praia do Leblon.
Era feriado, fim-de-tarde e eles iriam curtir o pôr-do-sol na orla da Zona Sul.
Andando pelos bairros mais caros do Rio num fim-de-semana prolongado pela comemoração da Independência, eu via toda aquela mistura.
Todos interagem, todos se misturam. O mar e as areias são de todos:
– Da classe média e média-alta que vive nos prédios de Copacabana e Ipanema, que vão a praia a pé;
– Do pessoal dos morros da Zona Sul, que também chega a pé;
– De quem vem do subúrbio de transporte coletivo – esse público aumentou muito desde a virada do milênio.
Pois as opções de metrô e ônibus melhoraram muito de lá pra cá;
– Dos turistas, muitos deles estrangeiros (por outro lado, seu número estava bem limitado na ocasião.
Estávamos na epidemia do Corona-vírus, que restringiu a maior parte do fluxo turístico, nacional e internacional);
– E dos moradores de classe-média dos bairros longe da orla, que vêm de carro.
Na praia, é tudo ‘junto e misturado’. Vendo isso, pensei: “o Rio é mesmo ‘a Cara do Brasil’ ”.
Ao passar pelo Vidigal, então, a lembrança dessa canção se consolidou na minha mente.
Taí. Num estalo, surgiu o título da matéria, e não pode haver outra:
Essa é a ‘Cara do Brasil’ – Rio de Janeiro, Cidade-Maravilhosa.
Assim É.
Continua….
Confira a série sobre o Rio de Janeiro:
– RIO 40º: CAPITAL DO MELHOR E DO PIOR DO BRASIL (setembro de 2022)
Abordando a tentativa da burguesia de se isolar num “subúrbio a estadunidense” na Barra da Tijuca – até os anos 90 deu certo, com a melhoria dos transportes que falamos em outro texto não mais.
E também do processo de remoção das favelas da Zona Sul no início do regime militar – igualmente começou com grande fôlego mas por diversos fatores foi interrompido.
Uma das que seriam retiradas seria a do Pavão-Pavãozinho/Cantagalo, na divisa de Copacabana e Ipanema. Como você vê ao lado, não deu certo.
Conto a origem do nome de algumas favelas, inclusive a mais antiga do Brasil, o Morro da Providência no Centro, e mais o Chapéu-Mangueira no Leme/Copacabana, quase a beira-mar na Zona Sul.
Falo ainda do “TeteCá”, a “língua” inventada no RJ que inverte a ordem das sílabas, da pichação de muros, e mais.
TELEFÉRICOS, BI-ARTICULADOS E PADRONIZAÇÃO DE PINTURA VIERAM MAS DURARAM POUCO (outubro de 2021) –
Houve enorme esforço de modernização pra Olimpíada, e alguns dos benefícios se mantiveram:
Ampliação do metrô, VLT, integração no cartão, elevador no Morro Santa Marta, e o próprio BRT, que na orla funciona bem.
Por outro lado o dinheiro acabou, situação já presente após o Rio-16, e que se agravou muito com a epidemia.
Vários setores do transporte coletivo carioca estão a beira do colapso, como alias também outras áreas como saúde, segurança e a própria governabilidade política.
O teleférico nos morros do Alemão e Providência, os bi-articulados e a padronização de pintura já se foram. A continuidade de todos os demais modais está ameaçada.
Além dessa radiografia do presente, traço uma perspectiva histórica do século 20, com ênfase especial dos anos 70 pra cá.
– 021: A CIDADE É MARAVILHOSA MAS . . . SE LIGA MEU IRMÃO!!! (janeiro de 2021) –
Que a situação está complicada e de forma multi-dimensional não é segredo pra ninguém.
Não o menor dos problemas é a violência urbana, evidente.
Faço uma breve retrospectiva histórica mostrando as origens dessa triste situação.
– CAPELINHA: RIO, SP, B.H., BELÉM E POA; PLACA NO ALTO: ESTAMOS NO SUDESTE –
(Publicado [originalmente via emeio] em agosto de 2014, muito antes dessa ida ao Rio portanto). Como o título indica, não é específica sobre a ‘Cidade-Maravilhosa’.
Abordo características dos ônibus (e até caminhões) que ocorriam em diversos estados brasileiros – e mesmo outros países latino-americanos. No entanto, falo um pouco do transporte carioca nesse texto.
“Deus proverá”